Crítica: A Casa do Dragão (1ª Temporada)

“A única coisa que poderia destruir a Casa do Dragão era ela mesma.”

A Casa do Dragão concluiu sua temporada na HBO de maneira extremamente satisfatória entregando uma série que apresenta os aspectos clássicos de Game of Thrones, mas também desenvolve uma personalidade trágica bem própria e única sobre os últimos anos de uma família destinada ao fim.

Ao longo do primeiro ano vemos o desenrolar das diversas indiretas e tensões familiares entre as famílias Velaryon, Targaryen e Hightower que ao longo de décadas constroem acordos e criam inimizades entre eles, tudo começando através de ameaças vazias até chegar em pontos onde não se poderá mais voltar atrás em suas ações e conflitos serão inevitáveis.

O foco da série é através de Rhaenyra, a jovem princesa impulsiva escolhida como sucessora do trono e que deverá carregar a missão de unir o reino guiada pela antiga profecia da Canção de Fogo e Gelo, paralelo a isso temos Alicent, rainha que deve assegurar que o seu filho Aegon tenha direito ao trono fazendo com que a família Hightower adquira o poder de Westeros.

Os demais personagens giram ao redor dessas duas figuras femininas imponentes, assim com o tempo um jogo vai se formando com peças se encaixando de cada lado na disputa de poder enquanto tanto Alicent quanto Rahenyra parecem buscar uma maneira de tudo isso não terminar em uma guerra.

O texto de Ryan Condal é bem preciso ao conseguir manter um fio de narrativa dos arcos de personagens, mesmo com saltos temporais e com o fato de a trama em boa parte ser situada em um período sem grandes conflitos e também consegue extrair um certo humor do desconforto dessas reuniões familiares desastrosas.

A direção da série se diferencia de Game of Thrones, pois apesar de evocar a grandiosidade e crueza do mundo lida também com elementos mais intimistas e com uso de detalhes e reações entre os personagens graças a diretores como Clare Kilner e Greg Yaitanes, desse modo de assemelha muito à construção de tensões familiares e um desenvolvimento de tragédias ao estilo de Sucession e The Crown, produções mais fechadas em núcleos que abraçam a melancolia.

É uma produção que exige atenção aos detalhes, muito pode ser dito através de como certos personagens se comportam perto de outros e como cada um deles se mostra, isso realça a prepotência da monarquia e reafirma a grande discussão de George R. R. Martin de que não se trata de uma história de fantasia apenas séria.

Mas também é uma enorme crítica à estrutura monarquista que traz uma busca constante de poder entre nobres vazios que querem a todo custo o poder, mas que não se importam com o povo que sofre nas ruas por suas políticas e desejos.

Além de ser visível um número maior de diretoras inserindo uma perspectiva feminina muito bem-vinda para esse universo, algo que gera algumas das melhores cenas da série e apresenta uma forma nova e prazerosa de se aproveitar esse mundo de Westeros e suas particularidades.

Nas atuações existem aqueles de forte presença em cena como Matt Smith como Daemon Targaryen, Rhys Ifans como Otto ou no trabalho de Steve Toussaint como Corlys Velaryon e Eve Best como Rhaenys Targaryen, mas também há um grande momento pra se destacar até mesmo entre os personagens que foram apresentados nessa temporada e devem crescer nas próximas como Matthew Needham como Larys Strong ou Tom Glynn-Carney como Aegon.

A grande força e a base da narrativa está em Alicent (Emily Carey, Olivia Cooke) e Rhaenyra (Milly Alcock, Emma D’Arcy), isso se percebe principalmente nos últimos episódios e na crescente das interações entre Cooke e de D’Arcy que podemos ver uma tensão entre elas, mas com um certo passado delas sempre presente de certa maneira nos diálogos.

Porém a temporada se define muito pelo trabalho de Paddy Considine como o rei Viserys I Targaryen que ao longo de todos os episódios vemos se deteriorar ao longo de anos e de fazer tudo que é póssívcel para proteger sua filha e manter a família e o reino em paz, um esforço que o consome aos poucos e que é possível que renda uma indicação ao Emmy para o ator futuramente.

Contudo, existem certas falhas na temporada, personagens meio deslocados do tom como Criston Cole (Fabien Frankel), a insistência em dar importância para a profecia e a escolha de terminar a temporada em uma ruptura de sentimentos gera um finale impactante, mas faz com que seu penúltimo episódio pareça mais arrastado do que deveria ser ao estender demais uma situação da trama.

Esses problemas se tornam um mero detalhe no fim, pois eles compensam com um trabalho admirável de construção de tensão e criação de mundo gerando uma experiência imersiva em Westeros e dentro desse núcleo de nobres pretensiosos, enquanto ainda nos oferecem um visual deslumbrante que ganha muita energia em diversos episódios seja pelo CGI dos dragões ou o ambiente esfumaçado e funébre das locações.

A Casa do Dragão entende bem o que pretende ser no panorama das séries modernas, ela se utiliza das minúcias das politicagens e do horror desse mundo violento já visto em Game of Thrones, mas aqui com um olhar mais próximo da nobreza e das vivências deles em grandes salões e reuniões.

Porém, se a outra série se inicia no realismo e caminha para a grandiosidade da fantasia, aqui vemos o aspecto grandioso sempre presente desde o começo enquanto a trajetória caminha para a melancolia e a tragédia anunciada dos Targaryen. Uma tragédia devido ao ego, acidentes, falhas da monarquia ou pelas articulações políticas há muito tempo feitas por pais motivados por destino ou ganância.

Como tudo isso irá desenrolar em uma das maiores guerras já vistas pelo universo de George R.R Martin, caberá aos próximos anos da série nos mostrar os eventos e os dramas por trás desses eventos históricos, mas uma coisa é certa.

Westeros voltou a ocupar seu trono na Cultura Pop.