Crítica: A Lenda de Candyman

Desde que os moradores se lembram, os projetos habitacionais do bairro Cabrini Green, em Chicago, eram aterrorizados por uma história de fantasma famosa sobre um assassino sobrenatural com um gancho na mão, facilmente invocado por aqueles que ousam repetir seu nome cinco vezes no espelho. Nos dias atuais, especificamente em meados de 2019, uma década após que as últimas torres de Cabrini foram derrubadas, o artista visual Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen II) e sua namorada, Brianna Cartwright (Teyonah Parris), se mudam para um condomínio de luxo em Cabrini.

Anthony é pintor, mas a sua carreira não anda muito bem, ele precisa de uma inspiração e um encontro com um antigo residente de Cabrini, o Burke (Colman Domingo) conta a história de Candyman e o inspira a pintar ele começa a explorar os detalhes macabros da história em seu estúdio, desvendo um passado complexo que desafia a sua sanidade mental e desencadeando uma série de acontecimentos bizarros ao seu redor.

A lenda de Candyman é uma nova versão do filme O Mistério de Candyman (1992) que lança uma nova perspectiva em torno da lenda urbana com a direção de Nia DaCosta e produzido pelo Jordan Peele conhecido por Corra (2017) e Nós (2019) é um diretor consolidado e tem encabeçado filmes  excepcionais que agradam tanto o público quanto a crítica.

Anthony está claramente fragilizado com uma sensação de inferioridade e Brianna na melhor fase de sua vida, conforme a vida dele vai demorando, ela sofre diretamente as consequências dos seus atos e Candyman (Tony Todd) cada vez mais presente na vida do casal, é uma figura complexa que deve promover certa ambiguidade na cabeça dos expectadores, vilão? Ou mocinho? Todos os seus movimentos são justificados? Vingar toda essa dor carregado de uma dor social é o ponto que faz a gente refletir.

Embora o longa de 1992 já trabalhasse com questões raciais, o novo filme consegue lidar com questões atuais, que nos conectam com eventos que envolvem a brutalidade policial e apropriação cultural, histórias que lemos nos jornais constantemente sendo expostas, podemos dizer que o filme é uma atualização, e é justamente isso que os filmes deveriam ser, se basear em um material original não tem problema, o problema é fazer cópia, mas quando você atualiza o material incorporando com dados reais, o torna interessante.

DaCosta, Peele e Win Rosenfeld são os responsáveis pelo texto, o filme flerta até diretamente com um certo estilo de animação diferenciado que dialoga com elementos da produção e isso o deixa mais esmerado, além de ter cenas de que as pessoas reagem a lenda urbana, afinal, é uma lenda e as pessoas lidam com desdém, e estão sempre buscando acreditar naquilo que veem, o que é palpável, o que não atinge a elas diretamente até que eles vivenciem uma experiência que pode não ser tão agradável.

O elenco coadjuvante cumpre apenas o papel definido por roteiro seja para morrer ou para interagir com o casal. A trilha sonora de Nós (2019) me marcou, neste filme ela é bem executada para fins de suspense, mas não chegou a ser tão notável – exceto a canção clássica de Sammy Davis Jr, Candyman. Nia DaCosta é elegante e mantém uma direção equilibrada, toda a violência não é tão explícita como costuma ser no subgênero de slasher – aqui teremos performances mais interesses como uma morte vista através da janela ou de um espelho, são mortes com estilo, se assim posso definir.

Com referências claras ao movimento Black Lives Matter e ao brutal assassinato de George Floyd, a produção está repleta de questionamentos em relação a segurança da população negra: Até que ponto a população negra se sente segura? Como essas pessoas estão assistidas? Até quando haverá essa violência racial?

Pois, o filme destaca que há muito tempo o Candyman existe, então é triste saber que em pleno século 21, as pessoas sejam classificadas por sua cor e que esse filme não é apenas uma ficção, é um manifesto e deve ser assistido por todos os talentos negros envolvidos, pela mensagem que transmiti e a forma que eleva o gênero do terror para contar histórias que mexem com o nosso psicológico e provocam a arte como um ponto de evolução da sociedade.