Pouco tempo depois do termino da quinta temporada de American Horror Story, intitulada ‘Hotel’, muitas teorias acerca do sexto ano começaram a brotar na internet, no entanto, diferente dos anos anteriores, nesse não houve nenhum anúncio feito pelos produtores, ou seja, o tema só foi revelado na hora da exibição e melhor do que a surpresa foi o susto em relação ao formato adotado.
Roanoke foi dividida praticamente em três partes, e acabo obrigado a analisá-las separadamente.
O Falso Documentário – My Roanoke Nightmare
Os 5 primeiros episódios seguem o formato de falso documentário, isso é, Shelby (Lily Rabe), Matt (André Holland) e Lee (Adina Porter) são as pessoas que viveram as situações bizarras na casa localizada na antiga colônia de Roanoke, enquanto a outra parte do elenco, são atores que interpretam as vitimas em uma versão ficcional de reconstituição. Em suma, as pessoas reais descrevem suas experiencias em uma entrevista enquanto os atores reconstituem o caso com base na narração.
O único problema de adotar esse formato é quebrar o fator de imprevisibilidade, afinal sabemos quem possivelmente sobreviveu, por conta das entrevistas. Ainda assim a série consegue fisgar o telespectador pela mitologia de Roanoke apresentada com maestria nessa primeira metade. Os eventos são assustadores e a estética documental deixa esse detalhe ainda mais acentuado.
Com apenas dois episódios exibidos já é possível se habituar com o novo estilo, e como já dito, não há ansiedade em descobrir quem sobreviveu, mas sim, como sobreviveu.
Esses 5 primeiros episódios possuem uma fotografia simples e atuações impecáveis tanto das personagens reais que concedem a entrevista, quanto dos atores que os interpretam na reconstituição. É impossível dizer que esse fragmento da temporada não merece nota máxima, além disso sua conclusão em poucos episódios foi sabia e necessária, uma vez que todos gostariam de degustar dos bastidores da produção e conhecer melhor as personagens.
Com isso somos levados ao 6ª episódio que nos revela os bastidores da produção e a ideia de produzir um spin off levando tanto os atores quanto as vitimas reais de volta a casa assombrada para serem filmados e transmitidos ao vivo.
O Reality Show – Return To Roanoke: Three Days In Hell
No sexto episódio a quarta parede é rompida e conhecemos os atores em seus bastidores e suas respectivas relações com as pessoas que de fato vivenciaram o horror de Roanoke.
A produção do programa ciente do sucesso do documentário resolve fazer uma suposta continuação, mas dessa vez com intuito de levar os atores junto das vitimas reais de volta para a casa de Roanoke. Nesse momento o teor crítico marcante da série se faz presente e sua premissa começa a se estabelecer acerca da ascensão midiática que parece ser um objetivo em comum para quase todos aqui, portanto os produtores querem dinheiro com a audiência e os atores além disso querem o prestigio social promovido pela fama, porém o que as vitimas almejam ao ponto de fecharem um contrato que as levem de volta ao local no qual elas quase morreram? As motivações encontradas pelos roteiristas são fracas e inconsistentes a principio, mas nos episódios seguintes percebemos que na verdade foram bem coesas.
Matt se mostra um cara preso ao que passou na sua estádia em Roanoke, Shelby é totalmente desequilibrada emocionalmente e capaz de loucuras pelo homem que ama, já Lee é a personagem mais intrigante e busca apenas o perdão da filha que a culpa pela morte do pai. Audrey (Sarah Paulson), Monet (Angela Bassett), Dominic (Cuba Gooding Jr) e Rory (Evan Peters) são os atores que participaram da reconstituição no documentário e o roteiro não se preocupa em dar profundidade a eles, não por incompetência, mas claramente por escolha, fica evidente que futilidade, egoismo e arrogância são os sentimentos que eles devem expelir ao máximo.
Com algumas poucas cenas retiradas das câmeras escondidas na casa, a maior parte dessa segunda metade é filmada pelos próprios personagens no mais comum found-footage. Esse estilo embora desgastado funciona bem na série e torna as cenas extremamente viscerais, ainda mais quando somadas ao incrível trabalho dos maquiadores e diretores de arte.
Como não é de se surpreender, o cast de American Horor Story segue imbatível em seu alto padrão de interpretações acompanhadas de uma boa direção. Sarah Paulson brilha novamente e rouba a cena, tendo interpretado a calma e assustada Shelby ficcional na primeira parte, e agora ela é Audrey, uma atriz britânica presunçosa que em seus momentos de desespero acaba nos cativando. Angela Bassett como Monet e Cuba Golding Jr como Dominic também não deixam nada a desejar. Adina Porter no final das contas se torna a estrela da temporada brilhando como Lee, uma mulher durona, traumatizada e disposta a tudo para reconquistar o amor de sua filha.
Kathy Bates é um detalhe brilhante a parte. No documentário ela interpreta a vilã conhecida como ‘A Açougueira’, já fora do programa ela é Agnes uma atriz que após esse papel ganhou uma legião de fãs e teve dificuldades de se desvincular da personagem, adquirindo uma espécie de distúrbio de dupla personalidade.
Os fantasmas apresentados nessa versão real da história são assustadores e apenas reforçam que essa é a temporada mais pesada da série.
Ao termino desses quatro episódios, resta apenas um sobrevivente e uma sequência de dúvidas acerca da repercussão que o reality teve.
O Desfecho – Season Finale
Infelizmente aqui a série peca ao negligenciar a veracidade dos acontecimentos, poupando explicações e criando situações pouco criveis, como um psicopata anunciando uma vingança no Youtube sem ser punido, tendo inclusive a oportunidade de tentar cumprir sua promessa.
As gravações do Reality foram encontradas, editadas e transmitidas, inicialmente deixando o público em dúvida acerca da realidade dos fatos, mesmo assim é pouco provável que algo do gênero fosse exibido na televisão, ainda mais sabendo que os familiares das vitimas estariam sendo expostos a uma situação abusiva e ilegal. Infelizmente a série ignora explicações acerca disso.
A critica social sobre a fama, dinheiro e reconhecimento continua presente, com uma série de programas promovendo entrevistas com o sobrevivente, além de alguns que chegam a visitar a mansão buscando constatar o que de fato aconteceu.
O desfecho do sobrevivente é belíssimo e tocante, refrisando o amor incondicional de uma forma sombria no estilo que a série adora fazer.
American horror Story: Roanoke é ousadia pura em um temporada que bebeu do mistério e arriscou tudo pelo novo, fazendo valer o beneficio de se trabalhar com uma antologia. A história não possui muitos momentos dramáticos e memoráveis como nas temporadas anteriores, mas os compensa com um excelente terror que promove uma critica extremamente atual, usando de metalinguagem para nos fisgar e promover reflexões.
*Spoiler: Enquanto todos em Roanoke buscavam o amor do público, dinheiro e a fama no geral, Lee conseguiu tudo isso, mas seu objetivo desde o inicio era minimalista, ela sabia exatamente o que queria conquistar e lutou por isso até o fim, abraçando uma sentença que para muitos é loucura mas para uma mãe é apenas consequência. Foi lindo e surpreendente.