“Carrie, A Estranha” é um dos grandes clássicos do cinema, dirigido por ninguém menos que Brian De Palma. O longa foi baseado na obra do mestre Stephen King que escreveu o livro logo no inicio de sua carreira como escritor.
Carrie White é uma garota comum, mas que recebeu uma criação conservadora e abusiva, privando ela de diversos conhecimentos e experiências de socialização. Na escola, Carrie sofre bullying e em meio as agressões acaba descobrindo um dom psíquico no qual ela passa a treinar. Ao ser convidada para o baile de formatura, ela resolve tentar enfrentar seus medos, mas infelizmente as coisas não saem como esperado, resultando em uma noite de horror.
A introdução do filme já começa com uma das sequências de nudez mais intrigantes do cinema. Aqui somos enviados ao vestuário feminino em uma cena extremamente naturalistas, acompanhando as garotas se vestindo e conversando, enquanto Carrie toma seu banho com calma e liberdade, transmitindo toda a tranquilidade e conforto desse momento intimo. Toda essa sequência é filmada sem pudores, expondo o corpo humano de forma cotidiana sem qualquer tentativa de sensualidade.
Grandes momentos do filme são gravados em planos sequência, acompanhando o olhar ou simplesmente o movimento dos personagens. As cenas de diálogos em sua maioria possuem um enquadramento mais dramático, muitas vezes entrando em planos psicológicos que abrangem o menor espaço possível e em algumas circunstâncias dão lugar somente para o rosto dos atores ou até mesmo apenas detalhes como os lábios e olhos, a fim de gerar um certo suspense acerca do assunto tratado.
As atuações são bem pontuadas. Chris (Nancy Allen), não é uma vilã, longe disso, porém possui uma conduta questionável. É mimada e não mede esforços para conseguir o que quer. A Atriz demonstra através de trejeitos, toda a sua elegância e sensualidade que serve de alicerce para convencer os outros a seguirem suas ordens. Sissy Spacek, da vida a Carrie com maestria. A atriz é bonita, porém seu jeito retraído, cabisbaixo e assustado gera estranhamento tanto em suas colegas como no público. Em suas cenas de desespero há um exagero que quase foge da realidade, mas torna-se aceitável dentro do que a narrativa se propõe a mostrar. Os olhos esbugalhados em seus momentos de medo fazem com que a experiência visual seja tocante, e assustadora como o gênero do filme se propõe a ser. Outro destaque é a mãe de Carrie, vivida por Piper Laurie, que é mais que uma mulher conservadora, ela é má. Seu olhar e suas expressões carregam uma carga emocional pesada e imponente em cada ambiente em que se faz presente, essa sim é de fato a vilã da história.
O figurino do filme é um ponto fortíssimo para construir a identidade da protagonista, uma vez que ela está fora dos padrões das demais garotas. Carrie veste roupas largas e longas, com cores escuras e desbotadas, seu cabelo é liso escorrido indo totalmente contra a moda da época. Sua mãe já é retratada como uma espécie de “bruxa”, seu cabelo despenteado e seu longo vestido preto só reforçam a impressão retrógrada e assustadora da mulher, colocando-a como um dos viés de condução do terror. Perante a isso as outras adolescente vivem maquiadas e esbanjam os prazeres da juventude, com roupas extravagantes e penteados tendência do momento.
A edição é frenética, fazendo uso de cortes bruscos entre uma cena externa radiante para as internas na casa de Carrie que na maioria das vezes é escura, iluminada apenas por velas, aumentando ainda mais a tensão do ambiente. Os efeitos sonoros são assustadores, alguns possuem referências claras a “Psicose”, outros são comandados por uma autêntica sinfonia macabra. A trilha sonora popular da época é encaixada na hora de ressaltar os jovens e suas rotinas deixando a situação cada vez mais próxima da realidade.
O longa resumido pela sinopse poderia causar a impressão de que o filme é apenas um drama sobre uma violência que prevalece sobretudo durante a adolescência, porém com o decorrer dos fatos e a inserção de elementos religiosos acabam causando espanto e gerando uma ambiguidade na cabeça do telespectador, rompendo a barreira do comodo e adentrando em questionamentos ainda mais profundos. Carrie estaria possuída e sendo usada por alguma força maligna? Sua mãe era realmente louca, ou estava certa? O filme se destaca como terror no momento em que ele se distância de apenas uma história dramática e começa a fazer o telespectador se questionar sobre a veracidade dos acontecimentos, resultando assim em um leque de interpretações.
Dentre os diversos elementos de horror presentes no filme, um dos mais poéticos e bizarros é o da figura de cristo com seus olhos abertos repletos de desespero, que mais adiante é representado por uma morte especifica, pregada na parede na mesma posição e expressão que a figura religiosa.
“Carrie, A Estranha” é um dos melhores filmes da aclamadíssima filmografia de Brian De Palma. Temos aqui um terror que foge dos padrões, provoca o público com temas relevantes, mas não deixa de lado toda a simbologia assustadora que funciona como carimbo do gênero em que o longa se enquadra.