Com a cultura pop enaltecendo diariamente a figura do zumbi não é surpresa que essa moda exerça influência no restante do mundo. Aqui percebemos que chegou a vez da Coreia apostar suas fichas nessa temática, seguindo diversas fórmulas e criando as suas próprias. Nesse lupe estonteante o resultado foi um belíssimo longa que só não alcança a perfeição por dois erros, sendo um deles um reflexo sociocultural triste.
O longa acompanha um executivo egoísta recém divorciado, que tem que conciliar seus problemas no trabalho com a vida da filha que sofre pela ausência da mãe. Para suprir esse problema, eles viajam para Busan afim de resolverem as pendencias deixadas pelo matrimonio. No entanto são surpreendidos por um apocalipse zumbi em meio ao trajeto feito por trem.
Não é segredo para ninguém que a Coréia do Sul é um país extremamente machista, e isso não passa batido das manifestações artísticas que ou funcionam como quebra de paradigmas, ou simplesmente os fortalecem como foi o caso aqui. As personagens femininas não chegam a ser sexualizadas como nos slashers americanos, mas é perceptível a quase total ausência de autonomia até na hora de se defenderem, tendo que sempre serem salvas pelos homens, o que cinematograficamente é triste, pois cria-se personagens não condizentes com as circunstâncias, já no cunho social é algo a ser rigidamente debatido.
Ainda falando das personagens, temos pontos positivos aqui apesar de tudo. Há uma presença muito forte de diferentes arquétipos e um belíssimo desenvolvimento no decorrer da trama. O filme usa do exemplo negativo para puni-lo e exprimir a conduta que não deve ser seguida, do outro lado temos um comportamento semelhante que amadurece e torna-se um herói genuíno.
Essa onda evolutiva das personagens é totalmente condizente com o que a obra faz em todo seu caminho. Aqui a empatia é posta em primeiro plano junto com as circunstâncias drásticas que levam o ser humano ao limite. Os zumbis no final das contas são o estopim para expor o caráter de cada um, resultando na morte para muitos ou na redenção para os mais aptos.
É impossível não torcer, chorar, e claro se assustar na medida certa sem ter grandes momentos apelativos repletos de convenções de gênero.
Alias, convenções é algo que o longa quebra muito bem com a direção de fotografia. Há um clichê em colocar a câmera como objetiva de uma personagem, em um plano close up, sendo o clássico momento em que a criatura ataca. Aqui porém usa-se essa técnica para gerar anseio no telespectador, que fica agoniado pela morte que não necessariamente é iminente.
A direção de arte é elegante e verossímil com a evolução da trana. É notável como os personagens vão ficando cada vez mais sujos e cansados, pontos também para maquiagem e continuísmo. A caracterização dos zumbis também é grotesca na medida certa e condizente com a mitologia que o roteiro constrói acima deles.
O longa no entanto peca pela exaustão. O terceiro ato é mais longo que o necessário e apesar do objetivo da obra já estar claro, ainda apelam em prosseguir com o filme dando a sensação de estar assistindo a sequência no mês corte. Felizmente essa exaustão embora claramente desnecessária, ainda é tensa e mantem o alto nível de adrenalina das cenas anteriores.
Apocalipse Zumbi chegou agora, mas já é uma indicação indispensável para quem gosta do gênero ou apenas da temática apocalíptica. Pode não ter recebido uma execução perfeita, mas trouxe um material tão grandioso que o permite ser consagrado.
O longa faz parte da grade da 40ª mostra Internacional de Cinema de São Paulo