Crítica: O Beco do Pesadelo

Quando o carismático, mas sem sorte, Stanton Carlisle (Bradley Cooper) se torna querido para a vidente Zeena (Toni Collette) e o seu marido mentalista Pete numa feira itinerante, ele ganha um bilhete dourado para o sucesso, usando o conhecimento adquirido com eles para ludibriar a elite rica da sociedade de Nova Iorque dos anos 1940. Com a virtuosa Molly (Rooney Mara) lealmente ao seu lado, Stanton planeja enganar um magnata perigoso com a ajuda de uma psiquiatra  Lilith Ritter (Cate Blanchett) misteriosa que pode vir a ser sua melhor adversária.

O Beco do Pesadelo é baseado no romance de 1946 de William Lindsay Gresham (O Beco das Almas Perdidas), que já foi previamente adaptado para cinema por Edmund Goulding em 1947. Uma obra em mãos tão competente com a do diretor Guillermo Del Toro desperta no mínimo a nossa curiosidade, pois em filmes como Helboy (2004), O Labirinto do Fauno (2006) e A Colina Escarlate (2015) nos impressionam muito, seja pelo cuidado do diretor como contador de histórias ou pela forma como cria um mundo fantástico de cenários e figurinos que constituem uma textura especial em seus projetos, algo que podemos ver até quando ele age apenas na produção, como já vimos no terror Mama (2013).

O diretor é ganhador do Oscar em 2017 pela direção do filme A Forma da Água que costumeiramente trabalhou com monstros nas suas produções, nesta produção ele experimenta outra vertente e reforça sua identidade através de elementos artísticos e monstruosos, mas eles não são o centro da história.

A história escrita por Del Toro é um suspense psicológico ambientado nos anos 40 e com a colaboração de Kim Morgan em que eles desenvolvem uma fábula sobre o pior do ser humano.

O filme é claramente dividido em duas partes – as cenas do circo e as cenas da cidade – obviamente que o circo é um cenário mais hostil e conveniente para aplicar as pitada de horror e suspense da trama, mas no segundo momento do filme o foco está em Stan (Bradley Cooper) e na sua parceira, a psiquiatra (Cate Blanchett).

Dentre os temas abordados, o longa fala sobre sofrimento, punição, morte e os efeitos mais cruéis que a mente humana pode conceder, além do instinto de sobrevivência. Ao deixar o seu passado para trás, Stan encontra com o líder do circo (Willem Dafoe) que é um ator tão competente que é difícil não tecer elogios para os seus papéis. Cooper conquista um espaço no circo por seu carisma e ambição, mas também pretende conquistar um amor, a fofa Molly (Rooney Mara).

Uma das falas de Molly que me chamou atenção no filme é que ela está satisfeita com a vida que leva no circo, estamos o tempo todo procurando algo que nos preencha e ouvir alguém dizer que se sente pleno com a vida que leva faz a gente questionar se de fato é comodismo ou é possível alguém se sentir completo levando uma vida mais pacata. E aí, como você se sente hoje?

Quem também brilha no filme é a Toni Collete, uma taróloga sensitiva que também vive no circo e que ajuda a enxergar  o caminho de Stanton que não a ouve, já Lilith (Cate Blanchett) é quem ele se encanta e fecham um acordo, por um momento0 gostaria de ter conhecido ainda um pouco mais dessa personagem, da relação dela com seus pacientes, o seu passado, mas é pouco aprofundado.

No entanto, dentro do que a atriz tem para trabalhar ela domina perfeitamente em suas cenas intrigantes e através de sua presença, talvez optarem por não aprofundar em outros aspectos pode ter sido uma decisão assertiva.

Cooper consegue extrair várias camadas do seu personagem, inclusive a naturalidade que ele encara as coisas, sendo que por trás tem motivações cruéis e pesadas como a própria relação com a mentira, já Molly parece ser a única que consegue ter acesso ao seu lado bom em meio a todos acontecimentos.

O filme é um mergulho bem denso ao que há de pior na humanidade e forma como nos propomos a ajudar uns aos outros, mostrando uma austeridade de encarar atos tão perversos, além de lidar com a perspectiva de levar a vida tentando ludibriar o outro para obter algum tipo de vantagem, algo que pode ser até bastante desconfortável a experiência.

Assim sendo, a produção apresenta um mundo de textura sombria, fascinante e repugnante que vai até os limites para nos lembrar de quão obscuro pode se tornar o ser humano em diferentes situações, algo que o diretor já pontuou em outros projetos, mas agora dedica-se apenas à esse conceito caminhar por seres desprezíveis enquanto a história passa por cenários elaborados com uma atmosfera noir.

O Beco do Pesadelo é muito difícil de ser digerido por nos jogar dentro de ações desumanas, mas que evoca grande força na sua cinematografia, narrativa e nos diversos personagens interpretados por um elenco admirável, um projeto que pode ser capaz de chegar na corrida das premiações tanto em questões mais técnicas, como talvez até render mais uma indicação de diretor para Guillermo Del Toro no Oscar.