Crítica: Doctor Who – A Igreja da Rua Ruby

“Era uma vez, na madrugada do Natal, uma estranha que foi à igreja da estrada Ruby Road.”

A Igreja da Rua Ruby é o primeiro Especial de Natal de Doctor Who desde a despedida de Peter Capaldi, mas também se trata da primeira aventura solo da nova era da série estrelando Ncuti Gatwa como Doutor e apresentando Millie Gibson como Ruby Sunday que será sua companheira nos próximos anos.

Na trama, há muito tempo atrás na véspera de Natal, um bebê foi abandonado na neve. Nos dias atuais, Ruby Sunday conhece o Doutor, confronta rapto de bebês, duendes e busca entender o segredo de seu nascimento.

O roteiro é mais uma vez assinado por Russell T. Davies e com direção de Mark Tonderai (A Última Casa da Rua, Locke & Key) entregando uma aventura que é diversão pura com clima de absurdos e contos de fadas natalino com uma química maravilhosa de Millie Gibson e Ncuti Gatwa mostrando que eles serão uma dupla perfeita de se acompanhar na série.

Ruby é uma jovem adulta carismática com uma mãe (Michelle Greenidge) e uma avó (Angela Wynter) que lhe amam muito, amigos em uma banda, mas ainda se sente incompleta e quer descobrir de onde vieram seus pais biológicos que lhe deixaram na neve em frente a uma igreja. Ela faz de tudo atrás de respostas, mas não encontra nada e paralelo à isso começa uma maré de azar em sua vida provocada por duendes e isso é percebido de longe pelo Doutor que a vigia diariamente.

O acaso faz com que os os dois se encontrem e formem uma parceria para lidar com duendes que se alimentam de bebês e ela se vê diante de uma situação de grande perigo com essas criaturas estranhas no Natal, a história é bem contada com clima teatral sabendo aproveitar os dois atores se entendendo e criando um forte elo pelos conflitos, humor ou pela conexão no fato de que ambos foram abandonados e sentem um desamparo em suas vidas.

Há um ótimo trabalho de efeitos em criar esses duendes e o seu navio mesclando maquiagem, efeitos práticos e CGI que dão vida a um universo de possibilidades para a série em um cenário inédito para Doctor Who, tudo muito bem segurado pelos dramas de Gibson como Ruby e pela imponência, carisma e atuação corporal de Ncuti como Doutor.

O seu Doutor se destaca em como é abertamente LGBT, engraçado, além de ser um herói nato e de ter um coração enorme demonstrando carinho até mesmo por um simples policial que encontra na rua. Se a amargura de Capaldi o tornaram o Doutor certo para os tempos de extrema-direita no poder naqueles anos, Ncuti é o Doutor que precisamos nesse cenário atual do pós-pandemia e de nossas dúvidas com o futuro.

Velhos fãs encontrarão diversos elementos clássicos, a aura mágica dos anos de Matt Smith, a dramaticidade dos primeiros anos de Christopher Eccleston e até o espírito da Clara em Ruby, mas mas talvez seja porque a série está sendo tão bem executada em capturar a alma da série que nos fará lembrar de outros bons momentos da produção.

Tudo aqui na verdade é único e novo, temos direito à cenas musicais (com ótimas performances dos atores), aparelhos extravagantes do Doutor e alguns mistérios intrigantes que prometem brincar com o tempo e a fantasia explorando ambientes nunca antes vistos, enquanto a série sabe quando ter riscos de vida e quando não deve se levar tão a sério.

A Igreja da Rua Ruby desliza um pouco em se apressar no seu final, mas ao apostar em melodrama, o cartunesco, o lúdico e no sentimento puro de Doutor por Ruby acabam criando uma finalização que nos emociona, diverte e traz aquele gostinho de “final feliz” típico de histórias natalinas.

Doctor Who introduz novos públicos e se reinventa cheio de energia revelando um caminho glorioso com esperança, criatividade e carisma puro de seus atores em tela enquanto nos entregam um pouco de como o mundo poderia ser ao nos permitir termos conexões, experimentar empatia e se jogar na aventura que é viver nossas vidas.

A série está mais viva do que nunca.