“Eu só vim aqui para escapar, mas eu encontrei algo muito maior do que eu mesmo”

Enfim pudemos conferir à Jogador Nº 1, a aguardada adaptação do livro de Ernest Cline que homenageia os mais diversos elementos da cultura pop dos anos 80 em uma grandiosa aventura épica que ainda é capaz de traçar um paralelo com o comportamento de nossa sociedade em um ousado vislumbre do futuro.

Lidando com muitas referências, tanto no roteiro como no visual, era possível pensar que teríamos um filme confuso, mas a produção acaba sendo uma grata surpresa, principalmente devido à direção, afinal temos aqui um Steven Spielberg inspirado e divertido, fiel às suas raízes dos anos 80, época que ajudou a definir as regras de como fazer um bom “blockbuster”.

A trama se passa no ano de 2044, a ficção científica segue Wade Watts (Tye Sheridan), que, assim como o resto das pessoas, prefere passar seus dias mergulhado na realidade virtual do jogo OASIS do que viver no mundo real. Dentro desse game, os usuários devem descobrir a chave de um quebra-cabeça épico, totalmente baseado na cultura do final do século 20, e assim adquirir um prêmio de valor inestimável. No entanto, para vencê-lo, Watts deverá abandonar a realidade virtual e voltar ao mundo real que vem fugindo durante toda a sua vida.

Crítica: Jogador Nº 1

A história usa dois bons e velhos conceitos popularizados e mal utilizados nos dias modernos, a jornada do herói (Star Wars: Uma Nova Esperança) e o MacGuffin (Indiana Jones), para aqueles que desconhecem, a jornada trata-se de um personagem que é retirado de sua zona de conforto para desbravar perigos e situações fora do seu comum e termina evoluindo até se transformar em um grande herói, já o MacGuffin foi usado de forma explicita em Indiana Jones, trata-se da busca por um elemento importante para o protagonista que move a narrativa constantemente fazendo-o ultrapassar diversas barreiras.

Há ainda uma grande sensação de “flashback” que surgem através de vários momentos e nos trazem à tona lembranças de filmes antigos, é o inescrupuloso burocrata de terno (E.T. – O Extraterreste), o grupo de amigos resolvendo desafios juntos (Jumanji, Os Goonies), a garota esperta e independente que impulsiona uma rebelião (Princesa Leia), o jovem sonhador e puro (Luke Skywalker) e o excêntrico e perturbado dono do jogo (Willy Wonka), além é claro do tom bem-humorado de aventura para toda a família.

Dito isso, o filme se apropria bem de tais técnicas e as desenvolve com cuidado seguindo a aventura do sonhador e carismático Wade Watts/Parzival, que através de seus diálogos simples, somos capazes de compreender seus anseios e frustrações, o mesmo também pode ser falado sobre os seus companheiros, Art3mis, Aech, Sho e Daito.

A produção traz bons arcos dramáticos que evoluem junto da ação, resultando em um filme ágil e bem elaborado em seus elementos. Ttudo aqui é palatável, somos convidados a adentrar nesse glorioso universo e aos poucos aquela boa e velha lição de moral dos filmes oitentista nos é apresentada de uma ótima forma.

Contudo, há alguns pontos no terceiro ato em que surgem soluções rápidas e fáceis que ligam rapidamente alguns personagens e finalizam o arco, nada que vá estragar sua experiência, mas é uma situação que é preciso relevar enquanto acompanha a aventura.

Tye Sheridan e Olivia Cooke são os principais por motivarem a história, Cooke vive a misteriosa, esperta, determinada e divertida Art3mis, uma habilidosa jogadora capaz de rivalizar com Parzival dentro do OASIS e chamar sua atenção, enquanto Sheridan faz de seu Wade Watts/Parzival um personagem de fácil gosto, pois é tímido, atrapalhado e inocente, mas conta com um coração cheio de sentimentos, tanto por Art3mis como também pelas possibilidades infinitas do OASIS.  Ambos por sinal ainda conseguem entrosar muito bem como esse casal que direciona e guia o telespectador pela aventura fantástica da trama tornando a viagem para esse mundo ainda mais prazerosa.

Ben Mendehlson volta a viver um vilão, o ator já havia mostrado um pouco de sua imponência em Uma História Star Wars: Rogue One e agora ele interpreta o ganancioso e inescrupuloso, Nolan Sorrento. Ben imprime uma forte presença em cena, sempre com um ar de superioridade e ameaça.

Mesmo com pouco tempo em cena Win Morisaki, Lena Waithe e Philip Zhao são ótimos e cheios de personalidade, com grande destaque para Waithe que rouba a cena como Aech em diversos momentos inspirados ao lado de Parzival, fora isso eles formam um grupo carismático e que nos afeiçoamos rapidamente ao longo da aventura.

Claro que não podemos esquecer também de dois importantíssimos atores, Mark Rylance como James Halliday, criador do OASIS e Simon Pegg como Ogden Morrow, que o ajudou na criação desse ousado projeto. Os dois possuem uma história de vital substância para a resolução da trama e nos fazem acreditar na amizade profunda entre eles.

Um ponto que sempre se mantém forte nos filmes de Spielberg é a direção de fotografia, que mais uma vez se mostra um dos maiores acertos da obra. A câmera se movimenta freneticamente com planos aéreos, travellings e planos-sequências proporcionando a sensação de imersão na história. Quanto às cores, para o mundo real há um bom uso de cinza e tons apáticos, mostrando um ambiente triste e desolado, enquanto que dentro do OASIS somos deslumbrados com uma refinada explosão de cores dos mais variados tons, o que faz de Jogador Nº 1 uma das maiores experiências sensoriais que o cinema já nos trouxe até hoje.

Crítica: Jogador Nº 1

A direção de arte possui designs belíssimos que saíram direto da mente de um gamer ou fanático por animes, pois não há limites para o que pode ser mostrado dentro do mundo virtual, cada figurino traz uma base na cultura pop e cada cenário parece obedecer suas próprias regras, já no mundo real existe uma forte sensação de ferro-velho por ruas e casas o que ajuda a entendermos um pouco do sentimento de negação desse local e o fascínio pelo fantasioso e irreal.

Steven Spielberg voltou ao seu estilo consagrado de filmes sessão da tarde extraindo boas atuações e mergulhando em estéticas atuais de games e filmes, ao mesmo tempo em que brinca com o público a cada pequena cena. O diretor aqui se interessa por direcionar uma simples narrativa e nos levar por um passeio psicodélico pela nova geração, ao mesmo tempo em que ele consegue contemplar o passado, equilibrando constantemente ação, romance, humor e aventura na medida certa e em uma verdadeira montanha-russa de emoções.

Por último, ainda temos que elogiar a escolha da trilha sonora com variadas bandas dos anos 80 que tocam e embalam a história, casando perfeitamente com os conceitos tecnológicos e referenciando muito a nossa amada cultura pop.

Podemos concluir que Jogador Nº 1 mira e acerta direto no coração dos fãs da cultura pop, seja você um gamer de Final Fantasy ou Overwatch, um fanático por super-heróis ou um amante dos clássicos filmes de aventura como De Volta para o Futuro e Os Goonies. Não perca essa chance única e se jogue no OASIS, a produção que nos trouxe de volta o Steven Spielberg que amávamos tanto na infância.


Trailer:

https://www.youtube.com/watch?v=ahbq2ZaiHwU

REVER GERAL
Roteiro
9
Direção
10
Atuações
9
Direção de Arte
10
Direção de Fotografia
10
Nascido em São Joaquim da Barra interior de São Paulo, sou um escritor, cineasta e autor na Cine Mundo, um cinéfilo fã de Spielberg e Guillermo del Toro, viciado em séries, leitor de quadrinhos/mangás e entusiasta de animações.