O início da história de “The Crown” é um tanto arrastado em seus primeiros episódios, e não consegue trazer tanto carisma à primeira vista, apesar de grandes técnicas em vários setores diferentes da produção, nessa etapa o roteiro atrapalha um pouco o desenvolvimento, o que pode desanimar o público, mas dado o devido tempo somos arremessados para um glorioso panorama histórico da coroa inglesa povoado por incríveis personagens cheios de humanidade.
“The Crown” conta a história da coroação da Rainha Elizabeth II e nos mostra o fardo que ela carrega ao longo dos anos assim como as lições que ela teve que aprender para se tornar a Rainha para seu povo, sempre aconselhada e guiada por Winston Churchill e acompanhada por seu marido o Príncipe Philip.
O maior problema da série reside justamente em seu roteiro, pois nele se apresentam diversos furos e decisões duvidosas que quase chegam a comprometer o produto final, no entanto também existem aqui alguns bons acertos que dão um ar original para a série. Ao longo dos dez episódios da primeira temporada percebe-se o intuito de se fazer uma evolução dramática de Elizabeth II ao mesmo tempo em que se elabora um panorama que percorre toda uma era de Elizabeth II sempre envolvendo algum momento histórico do reinado dela através de vários pulos temporais e alguns flashbacks nos fazendo compreender melhor certos arcos e personagens. A evolução dramática não funciona tão bem quanto o conceito de viajar pela história do reinado no panorama, entretanto existe uma falta de uma melhor apresentação de costumes da realeza britânica como também de contextos históricos e políticos, a série está sempre avançando no tempo é preciso ter cuidado especial em certos pontos para nos fazer compreender determinadas situações e o mesmo se aplica a certos elementos culturais da realeza dos quais o público em geral desconhece bastante. Faltou uma atenção peculiar com o público nesse momento, além de alguns elementos de arcos que são somente apresentados todavia não se dá a profundidade esperada.
A Direção de fotografia da série é um dos pontos mais altos da série com paletas de cores acinzentadas e escuras, cheias de sombras e forte contraste trazendo um ar pesado e sombrio ao redor do drama, além de ser recheada com planos longos fechados trabalhando bem o clima e o tom que a série busca.
O figurino e a direção de arte da série são impecáveis, nos mostrando a realidade da realeza e todo seu requinte que é historicamente coeso com a época, além de complementar muito bem sua fotografia, tudo isso mostrado através dos mais belos e luxuosos cenários da Inglaterra seja nos aposentos da Rainha ou nos grandes espaços da Igreja.
A direção da série é firme e cheia de nuances diferentes mas destoa um pouco de um episódio para o outro o que por vezes atrapalha o desenvolvimento da trama, dando altos e baixos para a temporada.
Agora chegamos a um dos pontos mais fortes apesar de alguns deslizes, o elenco e suas atuações. Logo de cara nos primeiros episódios já vemos quem são os atores que mais nos entreterão durante a temporada, Matt Smith como Príncipe Philip, John Lithgow como Winston Churchill e Alex Jennings como o ex-rei Edward. Matt Smith dá um show de atuação com carisma e peso dramático de seu irresponsável e complexado personagem que não se adéqua às mudanças quando sua mulher se torna a Rainha, Litgow rouba a cena com a melhor personificação de Churchill já feita na TV e no cinema fugindo da caricatura e transbordando simpatia e drama no controverso Primeiro-Ministro. Não podemos esquecer de Jennings, um dos personagens que mais se destoa do resto da família e do elenco por ser aquele que foi exilado da família após escolher um amor que não era aceito pela Igreja e pela Coroa, portanto ele é cheio de sarcasmo e ironia sempre pronto para criticar o reino e seus parentes com uma incrível sinceridade. Agora vamos aos pontos fracos, Claire Foy tem uma performance destoante já que em momentos apresenta apatia e em outro consegue entregar o que roteiro pede, o que faz com que muitos de seus arcos por suas limitações acabem sendo carregados pelas atuações daqueles que contracenam com ela como Litgow e Smith, esse com certeza é um dos maiores problemas da série, afinal se trata da protagonista da história.
Mais um grande problema de “The Crown” está na montagem da edição, que por vezes é confusa e desconexa gerando uma falta de ritmo que em diversos momentos arrasta acontecimentos simples, deixando episódios muito empolgantes e interessantes extremamente cansativos e fora de coesão, o que atrapalha muito o desempenho da série.
A trilha está um deslumbre, com uma música sombria e impactante composta por Hans Zimmer na abertura, direcionando o tom do drama da série. Há também trilhas clássicas no decorrer dos episódios e um bom uso do som, mais uma vez The Crown triunfa em seus elementos técnicos de narrativa.
Ao final de seus dez episódios da sua primeira temporada, mesmo com seus defeitos na produção, The Crown consegue concluir da melhor maneira possível nos mostrando uma das séries mais belas da Netflix recheada de atuações marcantes e que acerta muito bem no conceito de criar um panorama histórico da Inglaterra e da coroa inglesa, e com isso há muita expectativa para sua próxima temporada na qual veremos a narrativa partir mais do ponto de vista do Príncipe Philip de Matt Smith onde também acompanharemos aos poucos ele criando o jovem Príncipe Charles, e o crescimento de ambos nesse universo.